quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Lume

Procuro uma definição exata para a palavra vaga-lume
Uma explicação que transcenda as enciclopédias
Desminta os dicionários
Que, na epistemologia dos poetas,
Seja universal na língua da boca e do peito.

Um verbete que me traga um vaga-lume em plena matéria
Que, ao emitir vida,
Seja tão implacável em sua missão
Que, em sol a pino,
Em sua capacidade de ser clarice,
Clarifique-me.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Pequenas frestas de gaiola

Ainda menino, o amor se embrenhou em suas artérias. Desde então, qualquer que fosse o objeto de seu sentimento, aquilo sempre atava por completo. Nenhuma mecha de cabelo se movia, nenhum fragmento de pupila se dilatava, nenhum reflexo de dor se manifestava. Nem mesmo os líquidos de seu corpo digeriam nada sem que o amor lhe autorizasse. Era a expressão da mais profunda dedicação ao seu senhor absoluto.

Logo, o que era fundamental virou contratempo. Era preciso se lavar, comer, fazer com que os temas do mundo tivessem implicação em si, mas só tinha espaço para romancear.

Não tardou e logo a grande liberdade para ato amoroso cedeu lugar à monotonia. Ainda assim, insistia em marcar dia e hora para a Vida acontecer, embora ela deixasse de ser a cada truque. Tornava-se um pequeno emaranhado de não a fins. Recusando-se a admiti-lo, passou a acumular coisas mortas em seus aposentos. Em sua prepotência de eternidade, os relatos de dias passados carregavam cheiros apodrecidos.

Aquele que tinha nome de pássaro e destino de planar sobre matas virgens conseguia alcançar precariamente o teto de uma banca-de-revista, em sua sina por coleções de relatos perfeitos e imediatos.

Há muito, não se deixa ver à luz do dia. Há quem diga que ainda está em meio a pilhas e pilhas de declarações, planos e fotografias. Que seu sorriso iluminado deixou em seu rosto uma expressão permanente loucura, um remédio à apatia. E que não se dá conta de que habita sozinho esse pequeno universo chamado Fé.


segunda-feira, 2 de julho de 2012

Silhueta

Quando aconteceu, exercitava sua fina arte de devastar o mundo. Começou roçando o chão quente do cerrado e acabou encontrou a planta dos meus pés pelo caminho. Mesmo apertando os olhos, uma silhueta tátil se impunha altiva, estendendo dedos sobre mim. Como um recorte de um tempo imaginário, o instante passava sem emitir juízo. A vida acontecia ali e, no mais absoluto silêncio, apontava um parecer sem volta, mas cheio de fé, prazer e graça.

O fim é um desfecho ou um novo percurso?

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Império

Ousou travar, sem armas, uma batalha perdida. Inofensivo, entrou em campo como se não quisesse conquistar nada além da terra que estava sob seus pés. Não deu ordens, mas fitou o horizonte com olhos tão profundos que tudo o que se impunha de pé curvou-se em sua honra. Sem alarde, instalou sua bandeira e imperou sobre a Macedônia em mim.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Quando éramos música

Enquanto me metia a escrever canções, você se articulava em longas prosas. Um escolhia clássicos da literatura para torturar a já pouca esperança no mundo, outro devorava três best sellers por semana e acreditava nas oportunidades da sociedade democrática. Escrevíamos beijos demorados e mandávamos pelos ares, confundindo o tato, paladar e visão, porque tudo nos aflorava o prazer. Até cedermos um ao outro, éramos o vermelho e o negro puros, dois olhares singelos e desumanos. Às vezes, trovejávamos ou molhávamos a terra devagar, mas sempre fluidos como água do céu.

De braços abertos para a vida aos 16, um aprendia a entender e respeitar a língua estrangeiro e o carisma abobalhado do outro, que se esforçava a entender a sutileza dos carinhos - com aura falsa de desinteresse - daquele um. Não era banal, era bom. Éramos a pretensão da felicidade, por ousarmos colocar em prática o desafio de viver a dois, olhando mais para o presente do que para o futuro. Eu bem queria  estar aí com você, mas me contento em vibrar. Aqui de Marte, espero que tenha uma linda vida ao lado das pessoas que ama, e de mim - porque eu te amo e um mundo inteiro não se dissipa quando acabam as notícias.